SETE MONTES, SETE VALES E SETE FONTES
Do Vale à Montanha
Apelidada como “Olivais de Sete Montes e Sete Vales” já em 1327, ou referida como “Sete Vales e Sete Fontes” (Septem Valles et Septem Fontes) num documento do Arquivo Secreto do Vaticano datado de 1439, foi este o local que “naquela parte da grande Lusitânia, que a natureza fez no sitio aos olhos mais oculta (…) perto donde o rio Nabão (…) numa abrigada ao pé dum alto monte (…) vive uma companhia de pastores que, juntos debaixo do governo de Severo seu maioral (grão Mestre, Sumo Sacerdote…) (…)” e que “por justa ocasião chamarão os Sete Montes (…).
Entrada da Mata dos Setes Montes
A idílica natureza, por tradição na literatura bucólica costuma-se apresentar como cenário ideal para desenvolvimento da novela pastoril, e se algumas desenrolam-se em locais fictícios e não reais, o mesmo não acontece com “A Lusitânia Transformada”.
Com efeito, a Cerca do Convento é o lugar de encontro e acolhimento de misteriosos pastores que Fernão Álvares do Oriente anima na sua novela Arcadiana, não obstante a acção ter lugar numa espaço tão vasto quanto o Império Português do tempo em que o autor viveu. Interessa-nos por agora as alusões a Tomar, a ribeira do Nabão aparece citada dezassete vezes no decorrer da vetusta obra.
Vista sobre a Mata dos Setes Montes
As transcrições supracitadas, enquadradas no espírito da obra, de critica e sátira ao grau de corrupção a que tinha chegado o Império Português, parecem indiciar uma referência cifrada aos ex-freires da Ordem de Cristo que tinham sido expulsos pelo Frei António de Lisboa no tempo de D. João III, vazada nessa altura do ideário Templário, e que agora se reuniam secretamente em conclave, nas proximidades do que durante muitos séculos tinha servido de guarida a altos segredos da Ordem do Templo, ou seja, a Charola, alcançável pela vista a partir da Mata.
Mata dos Setes Montes e Charola em plano de fundo
A mítica Arcádia, agora transformada em Lusitânia, e vice versa, pode muito bem encontrar na Charolinha da Mata dos Sete Montes, cenário para se imaginar o encontro entre os Cavaleiros expulsos da Ordem de Cristo, por não terem aceitado a conversão de uma Ordem de Cavalaria
Se até aos dias de hoje, seria então, a Charolinha, o local na qual podíamos enquadrar os secretos encontros dos Cavaleiros disfarçados de pastores, após a leitura deste artigo por inteiro, poderemos pensar num outro local; a Charolinha como espaço profano facilmente acessível, e um outro, no alto do monte, como sagrado e velado.
Invocar a existência de colinas pressupõe a ideia de Vales, aliás, nome já referido anteriormente em documento medieval como designação desta Mata (Sete Montes e Sete Vales), o que pode remeter-nos para “evidente..sentido da denominação de Filhos do Vale, atribuída por Zacharias Werner aos membros de uma confraria de Irmãos adeptos, constituindo ab origine a Igreja secreta de Cristo, i. e., a Igreja interior ou Confraria dos Superiores Desconhecidos, subjacente à actividade da Ordem do Templo, bem assim como à maçonaria templária do séc. XVIII, ambas manifestações transitórias, patrocinadas pela Confraria do Vale, protagonista da obra de ficção homónima.. Pelo seu lado, Fernando Pessoa não se coibirá de sublinhar que o termo vale comprova “a baixa qualidade da iniciação que ela [a Ordem] ministra, em relação à alta iniciação, nas Altas Ordens, referida sempre a uma montanha, seja a de Heredom, seja a de Abiegno!”*1. Elucubrações que não resistimos dar-vos a conhecer.
Henry Corbin, após reflexão sobre essa obra mística de 1803, “Filhos do Vale”, atribui-lhe a intenção de ressurreição do ideal Templário ao pretender reconstruir o Templo onde perenemente se subjugará ao serviço do espírito. Esta visão do Templo prende-se à ideia o Evangelho Eterno, anunciado por Joaquim de Flora, e também à Terceira Idade e à Terceira Ordem de que se ocupou Fernando Pessoa. Tal como em Pessoa esta Terceira Ordem é uma Ordem de cariz místico, oculta até mesmo no sentido de “oculta aos olhos dos pastores”.
Gruta na Mata junto à Charolinha com acesso por antiga escadaria
“O segredo é do Vale, tão bem guardado como outrora o Graal no seu recinto mágico”. Fernando Pessoa alude a este vale, no seu poema “Do Vale à Montanha”, e como já aludido anteriormente, diz-nos este, que “para lá chegar é preciso receber a iniciação, atravessar o vale”.
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“Do Vale à Montanha” de Fernando Pessoa
*1 nota: "A acção inicia-se em Limasol, praça-forte do Templo em Chipre, na ocasião em que, face à decadência da Milícia, o capítulo vota o regresso a França e a destruição de rituais e livros secretos. Na sombra, assiste-se à acção dos Filhos do Vale, os quais preparam o destino de Molay, castigado por ter ultrapassado as suas competências. A segunda parte do drama evoca o processo dos templários em Paris e o seu suplício. Por decisão dos Superiores desconhecidos a Ordem será "adormecida". Molay compreende e aceita a punição. Purificado pelo arrependimento, é recebido no seio dos Filhos do Vale, caminhando para a fogueira, enquanto Robert de Heredom parte para a Escócia onde reconstruiria a Ordem sob a aparência da maçonaria". de Manuel J. Gandra
Próximo Capítulo:
A 1ª INCURSÃO
A descoberta
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