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12/04/2010

OS PASTORINHOS DE SANTA BÁRBARA - PARTE II

SETE MONTES, SETE VALES E SETE FONTES
Do Vale à Montanha

Apelidada como “Olivais de Sete Montes e Sete Vales” já em 1327, ou referida como “Sete Vales e Sete Fontes” (Septem Valles et Septem Fontes) num documento do Arquivo Secreto do Vaticano datado de 1439, foi este o local que “naquela parte da grande Lusitânia, que a natureza fez no sitio aos olhos mais oculta (…) perto donde o rio Nabão (…) numa abrigada ao pé dum alto monte (…) vive uma companhia de pastores que, juntos debaixo do governo de Severo seu maioral (grão Mestre, Sumo Sacerdote…) (…)” e que “por justa ocasião chamarão os Sete Montes (…).


Entrada da Mata dos Setes Montes

A idílica natureza, por tradição na literatura bucólica costuma-se apresentar como cenário ideal para desenvolvimento da novela pastoril, e se algumas desenrolam-se em locais fictícios e não reais, o mesmo não acontece com “A Lusitânia Transformada”.

Com efeito, a Cerca do Convento é o lugar de encontro e acolhimento de misteriosos pastores que Fernão Álvares do Oriente anima na sua novela Arcadiana, não obstante a acção ter lugar numa espaço tão vasto quanto o Império Português do tempo em que o autor viveu. Interessa-nos por agora as alusões a Tomar, a ribeira do Nabão aparece citada dezassete vezes no decorrer da vetusta obra.


Vista sobre a Mata dos Setes Montes

As transcrições supracitadas, enquadradas no espírito da obra, de critica e sátira ao grau de corrupção a que tinha chegado o Império Português, parecem indiciar uma referência cifrada aos ex-freires da Ordem de Cristo que tinham sido expulsos pelo Frei António de Lisboa no tempo de D. João III, vazada nessa altura do ideário Templário, e que agora se reuniam secretamente em conclave, nas proximidades do que durante muitos séculos tinha servido de guarida a altos segredos da Ordem do Templo, ou seja, a Charola, alcançável pela vista a partir da Mata.


 Mata dos Setes Montes e Charola em plano de fundo

A mítica Arcádia, agora transformada em Lusitânia, e vice versa, pode muito bem encontrar na Charolinha da Mata dos Sete Montes, cenário para se imaginar o encontro entre os Cavaleiros expulsos da Ordem de Cristo, por não terem aceitado a conversão de uma Ordem de Cavalaria em Ordem de Clausura, com os que nela se mantiveram, para celebrarem misteriosos ritos de Cavalaria Iniciática.



Se até aos dias de hoje, seria então, a Charolinha, o local na qual podíamos enquadrar os secretos encontros dos Cavaleiros disfarçados de pastores, após a leitura deste artigo por inteiro, poderemos pensar num outro local; a Charolinha como espaço profano facilmente acessível, e um outro, no alto do monte, como sagrado e velado.

Invocar a existência de colinas pressupõe a ideia de Vales, aliás, nome já referido anteriormente em documento medieval como designação desta Mata (Sete Montes e Sete Vales), o que pode remeter-nos para “evidente..sentido da denominação de Filhos do Vale, atribuída por Zacharias Werner aos membros de uma confraria de Irmãos adeptos, constituindo ab origine a Igreja secreta de Cristo, i. e., a Igreja interior ou Confraria dos Superiores Desconhecidos, subjacente à actividade da Ordem do Templo, bem assim como à maçonaria templária do séc. XVIII, ambas manifestações transitórias, patrocinadas pela Confraria do Vale, protagonista da obra de ficção homónima.. Pelo seu lado, Fernando Pessoa não se coibirá de sublinhar que o termo vale comprova “a baixa qualidade da iniciação que ela [a Ordem] ministra, em relação à alta iniciação, nas Altas Ordens, referida sempre a uma montanha, seja a de Heredom, seja a de Abiegno!”*1. Elucubrações que não resistimos dar-vos a conhecer.


Henry Corbin, após reflexão sobre essa obra mística de 1803, “Filhos do Vale”, atribui-lhe a intenção de ressurreição do ideal Templário ao pretender reconstruir o Templo onde perenemente se subjugará ao serviço do espírito. Esta visão do Templo prende-se à ideia o Evangelho Eterno, anunciado por Joaquim de Flora, e também à Terceira Idade e à Terceira Ordem de que se ocupou Fernando Pessoa. Tal como em Pessoa esta Terceira Ordem é uma Ordem de cariz místico, oculta até mesmo no sentido de “oculta aos olhos dos  pastores”.


Gruta na Mata junto à Charolinha com acesso por antiga escadaria

“O segredo é do Vale, tão bem guardado como outrora o Graal no seu recinto mágico”. Fernando Pessoa alude a este vale, no seu poema “Do Vale à Montanha”, e como já aludido anteriormente, diz-nos este, que “para lá chegar é preciso receber a iniciação, atravessar o vale”.
s  

“Do Vale à Montanha” de Fernando Pessoa


*1 nota: "A acção inicia-se em Limasol, praça-forte do Templo em Chipre, na ocasião em que, face à decadência da Milícia, o capítulo vota o regresso a França e a destruição de rituais e livros secretos. Na sombra, assiste-se à acção dos Filhos do Vale, os quais preparam o destino de Molay, castigado por ter ultrapassado as suas competências. A segunda parte do drama evoca o processo dos templários em Paris e o seu suplício. Por decisão dos Superiores desconhecidos a Ordem será "adormecida". Molay compreende e aceita a punição. Purificado pelo arrependimento, é recebido no seio dos Filhos do Vale, caminhando para a fogueira, enquanto Robert de Heredom parte para a Escócia onde reconstruiria a Ordem sob a aparência da maçonaria". de Manuel J. Gandra

Próximo Capítulo:
A 1ª INCURSÃO
A descoberta

1 comentário:

RUI GONÇALVES disse...

Podem aumentar a resolução das fotos carregando nelas.