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8/19/2011

SIGNUM SALOMONIS de J. Leite de Vasconcelos

inserido no "Arqueólogo Português" de 1918 | Apresentação Cethomar


(…) Branco de Castro, reclinado sobre a cama, no seu pequeno quarto de estudante, recitava vocábulos, conjugava verbos, declinava nomes; e eu sentado numa cadeira ao pé, ia apontando fervoroso tudo o que lhe ouvia, e que para mim era como aquelas maças de ouro que, segundo um conto popular bem conhecido, saíam da boca de uma virgem bem fadada (…). Ao contrário de Orfeu, que ao som da sua lira arrastava os penhascos e fazia para os rios, aqui a musica cedia ao encanto da língua de (…). Isto constituía de facto uma novidade para os estudantes que não sabiam que em Portugal se falava uma outra língua além do português de Bernardes e Garrett. O mais encantado, porém, era eu. Com certeza não se escutavam com maior atenção os oráculos de Apolo em Delfos ou os de Zeus em Dodona, do que as palavras que o meu Branco de Castro proferia, sereno e resignado, diante de mim.
- Isto é uma gíria de pastores, uma fala de charra, não tem regras, nem normas!
Mas, quando eu lhe mostrava que as correspondências (dessa língua) com o latim eram certas, que a conjugação seguia com a ordem, ele pasmava e admirava-se que entre os cabanhaes de Genízios, e em meio dos hortos de Ifánez, se pudesse ter feito coisa tão regular como era a língua que velhos cabreiros lhe haviam ensinado em pequeno (…) esta deserdada e perdida filha do latim. (…) "

Obviamente, a linguagem em causa é o Mirandês, a qual foi reconhecida na década de noventa do século passado como a nossa segunda língua oficial, tendo a sua apresentação num concurso promovido pela Société des Langues Romanes em França, ganho o único prémio pecuniário atribuído no ano de 1833 pelo resultado alcançado pelo surpreendente opúsculo que J. Leite de Vasconcelos enviou apenas com a intenção de ver o nosso país representado.

Estudos de Filologia Mirandesa de J. Leite Vasconcelos 

Este episódio é representativo da importância da obra que J. Leite de Vasconcelos produziu ao longo da sua vida e ilustra bem a ideia que constituiu o Leitmotiv que o guiou nos diversos caminhos que trilhou tentando demonstrar que ao contrário do que Alexandre Herculano dissertava quanto às origens da nacionalidade do homem português, – que não podia entroncar nos lusitanos mas coincidia com o inicio da nacionalidade – o português descendia de povos anteriores e a eles se achava “vinculado por laços de toda a ordem”.

Esconde-se nos costumes e tradições populares a memória ancestral que permite traçar também a história de Portugal, aquela história que aos olhos de muitos não passava de ruralismos e cultura arcaica degenerada que pouco tinha para contribuir para a construção da história da nossa nação. Todavia, Leite de Vasconcelos demonstra o contrário, e regista meticulosamente aspectos de uma realidade esquecida na historiografia oficial que se vinham impondo e olvidando a história viva que ainda pulsava no português que se exprimia sob uma linguagem de cabreiros ou naqueles que semeavam os campos.

Pergunta agora o leitor o porquê destas palavras iniciais e de que modo se interligam com os temas que por norma tratamos relacionados com Tomar.

Pois bem, J. Leite Vasconcelos é autor de dois artigos sobre o Signum Salomonis (pentalfa, pentagrama, hexagrama), porventura o maior publicado na nossa língua até aos dias de hoje, e no qual faz o levantamento de centenas desses símbolos disseminados pelo nosso território, e não limita esse registo apenas à arquitectura e à arte, mas a todos os veículos que o expressam, e que tanto pode ser, de facto a arquitectura religiosa, como uma canga para o cachaço dos bois.



E mesmo assim poderá subsistir no leitor menos atento ao património de Tomar dúvidas quanto ao motivo para apresentar tal trabalho: a fachada principal da igreja de Santa Maria do Olival apresenta ostensivamente um pentagrama! Pentagrama esse ao qual Leite Vasconcelos confere alguma atenção, não deixando de o reproduzir no seu artigo – diga-se, de uma forma tosca(na).

Algumas dos pentagramas do artigo "Signum Salomonis"
onde se vê o pentagrama da igreja de Santa Maria dos Olivais em Tomar
  
Pelo contributo da obra de Leite Vasconcelos para com a história da “consciência” portuguesa, à qual talvez se possa atribuir o mesmo valor que à "História de Portugal" de Herculano para conhecimento da nossa herança cultural e histórica, fomos tentados a fazer uma apresentação do homem e da sua obra, mas tal tarefa seria ingrata para com o próprio, até porque dificilmente conseguiríamos expressar essa homenagem como o fez o seu amigo Viegas Guerreiro, continuador da obra do mestre e responsável pela publicação dos restantes volumes da Etnografia Portuguesa – Vasconcelos em vida só viu quatro prontos e três publicados – coligindo-os a partir de elementos deixados por Vasconcelos, o qual, à beira da morte em 1941 adivinhava ainda mais quinze anos de trabalho para a sua conclusão – o último volume só foi publicado em 1989.



"Etnografia Portuguesa" de J. Leite de Vasconcelos

As palavras de Viegas Guerreiro fazem justiça à sua memória como poucas outras que se conheçam, e não será por demais, dizer que são de tal ordem comoventes que muito nos emociona as podermos dar a conhecer na íntegra.

E já que temos no nosso Cetarquivo, alem deste artigo de difícil acesso – mesmo tendo sido reeditado na segunda edição da Revista Lusitana pelo próprio Viegas Guerreiro já em idade avançada – ter também digitalizado o de Orlando Ribeiro, porque não o incluir também? Não fica este artigo de Orlando Ribeiro atrás do texto de Viegas Guerreiro no que respeita à memória da vida de Vasconcelos. Trata-se de dois artigos publicados em 1942 e 1958, logo após a morte do Mestre, e reeditado em 1960 com “pequenas leves alterações” para a inclusão no “Livro do Centenário de José Leite de Vasconcelos”. Esta nossa inclusão reproduz a de 1960 inserida na Revista Lusitana e compreende 34 páginas.


Final do texto de Viegas Guerreiro

Em cima: Orlando nos Açores e ainda jovem com Leite de Vasconcelos
Em baixo: Jose Leite de Vasconcelos e Orlando Ribeiro ainda jovem

Para terminar, e voltando ao motivo desta nossa iniciativa em parceria com o Cetarquivo, resta dizer que é intenção do Cethomar publicar um ensaio sobre o pentagrama incluso na fachada da igreja de Santa Maria do Olival, tendo-se socorrido dos dois textos agora apresentados – e não só – para a sua realização, e tendo noção da importância desta obra, pouco divulgada apesar de acessível no arquivo do Arqueólogo Português na internet, achamos por bem promover a sua acessibilidade a todos aqueles que se interessem pelo tema adicionando-lhe os textos já referidos.


 Conteúdo do pdf:

 APRESENTAÇÃO
por Cethomar

NOTAS PARA UMA BIOGRAFIA
 do Doutor J. Leite de Vasconcelos
por Viegas Guerreiro | 26 pág.

VIDA E OBRA
de J. Leite de Vasconcelos
por Orlando Ribeiro | 34 páginas

SIGNUM SALOMONIS
 de J. Leite de Vasconcelos | 113 páginas

ADITAMENTOS AO SIGNUM SALOMONIS
 de J. Leite de Vasconcelos | 4 páginas

Quem desejar aceder apenas ao artigo do Signum Salomonis pode fazê-lo de imediato pela hiperligação existente no texto acima publicado, o qual conduz directamente para o local do arquivo do Museu Nacional de Arqueologia onde se encontra o artigo. Quem desejar por completo o conteúdo do pdf apresentado deverá enviar-nos o email para o qual devermos o remeter.

 Dois pentagramas de duas igrejas e ao meio o pentagrama da Igreja de Santa Maria dos Olivais em Tomar

5 comentários:

RUI GONÇALVES disse...

Esperamos que gostem desta nossa iniciativa.

Anónimo disse...

Eu gostei. Lysardo

Arnaldo M disse...

Também eu gosto de publicar eventos e iniciativas de Santa Maria, mas dos Açores, estava a navegar na net à procura de novidades da minha terra, quando encontrei o vosso blog e gostei. considerem uma visita ao meu blog, sobre a "minha" Santa Maria http://santamariaazores.com.
Parabéns pelo vosso trabalho.

RUI GONÇALVES disse...

Arnaldo muito nos honra ter gostado. Iremos então fazer uma visita ao seu blog. Obrigado

Anónimo disse...

Diria mesmo interessantíssimo
Bernardo Catarino de Santa Cita